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No Tocantins, mineradora alvo de ação judicial negligencia impactos sobre quilombolas 

A negligência ambiental e os impactos sobre comunidades tradicionais no Tocantins.

Em época de chuva, os moradores de Almas, no sudeste do Tocantins, costumavam sair de casa para procurar pepitas de ouro nas ruas. A abundância do metal, que deu à cidade o apelido de “capital do ouro” do Tocantins, contrasta com a recente escassez de um bem vital: a própria chuva, que tem se tornado bem mais esparsa na região na última década. O ouro continua a jorrar, mas agora apenas para uma única empresa, a mineradora canadense Aura Minerals, que desde 2023 extrai o metal em uma mina a céu aberto, próxima a comunidades quilombolas.

A alteração no ciclo das chuvas, com a redução drástica dos meses chuvosos, já afeta as roças dos moradores da Baião e de outras comunidades próximas a cerca de 300 quilômetros de Palmas. No entanto, a mudança climática não é o único problema hídrico. O acesso dos quilombolas à água está cada vez mais comprometido, conforme relata um morador. A natureza que antes era considerada “perfeitinha” está desaparecendo, com nascentes sendo obstruídas e niveladas por máquinas, agravando a crise hídrica local.

O Contexto do Agronegócio e a Mineração

Os impactos negativos na região são atribuídos não apenas às mudanças climáticas, mas também à expansão do agronegócio. Fazendeiros têm ocupado a área para o plantio de soja, impulsionados pelo decreto do Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), assinado em 2015, que visa incentivar o agronegócio na região. Este cenário inclui desmatamento e a contaminação da água por agrotóxicos. Todos os municípios do Tocantins fazem parte do Matopiba, considerada a última fronteira agrícola do país, que recebe grandes volumes de recursos governamentais.

A situação hídrica se agravou com a exploração de ouro pela Aura Minerals no rio Manuel Alves, principal rio da região, situado a poucos quilômetros da Baião e de outras três comunidades quilombolas. Apesar da percepção evidente da mudança climática pelos moradores, o Instituto Natureza do Tocantins (Naturatins), órgão ambiental responsável, não considerou esse fator ao autorizar o projeto de mineração, ignorando os impactos diretos sobre a segurança hídrica local.

Licenciamento Ambiental Questionável

O licenciamento ambiental para a mina da Aura Minerals foi aprovado pelo Naturatins em 2021. O problema central, questionado em uma Ação Civil Pública (ACP), é que a aprovação se baseou em um Estudo Ambiental Simplificado (EAS) produzido em 2011, quando a concessão da área pertencia à Rio Novo Mineração. Não foi exigido um Estudo de Impacto Ambiental (EIA) atualizado, nem seu respectivo Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), que são modalidades mais completas e necessárias para atividades de mineração.

A ACP, proposta pela Defensoria Pública do Tocantins e pela Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Tocantins (COEQTO) em dezembro de 2023, aponta que as condições ambientais se modificaram significativamente entre 2011 e 2021, especialmente com projetos de irrigação de fazendas que impactaram o abastecimento de água. A extração e beneficiamento de ouro dependem diretamente do uso intensivo de água, o que coloca em risco a segurança hídrica das comunidades.

Riscos Iminentes para as Comunidades

A mineração da Aura Minerals capta água do rio Manuel Alves através de uma adutora instalada em suas margens. Além do desvio do rio, a instalação mais preocupante é a barragem de rejeitos sólidos, localizada a apenas 5,6 quilômetros da comunidade Baião, bem na área da nascente do córrego Riachão, que é a principal fonte de água da comunidade. Outra comunidade, São Joaquim, fica ainda mais próxima da barragem, a 2,6 quilômetros, e teme pela contaminação das fontes de água cruciais para sua subsistência, como o Riacho do Ouro, afluente do rio Manuel Alves e do rio Tocantins.

Os quilombolas vivem sob constante ameaça, comparando a barragem a uma “pedra colocada acima de nossas cabeças”, especialmente após os recentes desastres ambientais em Mariana e Brumadinho. Moradores relatam que a área da mina é restrita e que a empresa impede gravações. O temor de um rompimento é real, pois a barragem está localizada acima das comunidades.

A Ausência de Consulta e Preparação

A falta de transparência e comunicação é evidente. Os moradores da Baião não foram avisados sobre a existência de um plano de fuga nem receberam treinamento adequado sobre como agir em caso de um eventual rompimento da barragem. O cenário é agravado pela poeira constante gerada pelos caminhões que circulam incessantemente na operação de mineração, escavando um buraco gigantesco que se tornou o centro de um conflito territorial e ambiental com quatro comunidades quilombolas que lutam há décadas pela titulação de suas terras.

A situação reflete uma negligência grave no processo de licenciamento, onde os direitos dos povos tradicionais foram ignorados.

“Essa natureza que nós temos, que era perfeitinha, infelizmente está acabando. As nascentes que tinham olho d‘água, eles entupiram tudo, meteram a máquina, nivelaram as grotinhas menores.”

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