Você está aqui
Home > Política > Análise Regulatória: CCJ do Senado Avalia Impacto do Sinal Locacional da ANEEL no Setor de Energia Limpa

Análise Regulatória: CCJ do Senado Avalia Impacto do Sinal Locacional da ANEEL no Setor de Energia Limpa

A retomada do debate sobre o PDL 365/2022 na CCJ define o futuro da aplicação do sinal locacional da ANEEL e sua consequência direta na viabilidade da expansão da energia limpa no Brasil.

Conteúdo

Visão Geral

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal voltou a colocar em pauta o PDL 365/2022, um Projeto de Decreto Legislativo que se tornou um divisor de águas no setor elétrico brasileiro. A análise deste projeto reacende um dos debates regulatórios mais quentes da última década: a aplicação e os impactos do chamado sinal locacional da ANEEL nas tarifas de transmissão. Para os profissionais de energia, especialmente aqueles dedicados à geração renovável, o que está em jogo é nada menos que a segurança jurídica e a viabilidade econômica de grandes empreendimentos, particularmente no Nordeste.

A retomada da discussão na CCJ não é apenas um movimento burocrático, mas sim o ponto crucial onde a política e a regulação se encontram. Se aprovado, o PDL 365/2022 susta as Resoluções Normativas da ANEEL que ajustaram os critérios para o cálculo das tarifas de uso do sistema de transmissão e distribuição (TUST/TUSD), intensificando o sinal locacional. Este mecanismo, embora tecnicamente justificado pela agência reguladora, gerou uma onda de críticas por penalizar as fontes limpas que, por natureza, estão longe dos grandes centros de consumo.

O Custo da Distância: O Que É o Sinal Locacional

Para entender a profundidade do debate, é essencial mergulhar no conceito do sinal locacional. Simplificadamente, ele é um componente das tarifas de uso da rede que busca internalizar os custos de transmissão da energia elétrica. A ideia central da ANEEL é que usinas mais distantes dos centros de carga ou que exigem maior investimento em infraestrutura de rede para escoar sua produção devem pagar mais pelo uso do sistema.

Essa lógica é economicamente eficiente sob a ótica da infraestrutura. O objetivo do sinal locacional é incentivar os novos empreendimentos de geração a se instalarem mais próximos dos grandes mercados consumidores, minimizando a necessidade de expansão da rede de transmissão. Contudo, essa eficiência teórica colide brutalmente com a realidade geográfica e de recursos naturais do Brasil, um país continental onde os melhores ventos e a melhor irradiação solar estão justamente longe do Sudeste industrializado.

O Dilema das Energias Renováveis

O grande calcanhar de Aquiles do sinal locacional intensificado é seu impacto desproporcional sobre as fontes eólica e solar. O Nordeste brasileiro, celeiro natural para a geração eólica e solar fotovoltaica, concentra vastos projetos de energia limpa. Estas usinas precisam usar longas linhas de transmissão para levar sua eletricidade até os centros de consumo do Sul e Sudeste, arcando com o custo extra do transporte.

O setor de energia limpa argumenta que a intensificação do sinal locacional atua como um desincentivo geográfico, aumentando significativamente os custos da TUST/TUSD para projetos renováveis. Isso não apenas encarece a energia, mas também ameaça a competitividade dos leilões e inviabiliza investimentos que já estavam planejados. Muitos consideram que a medida da ANEEL ignora a necessidade de desenvolvimento regional e a matriz energética sustentável do país.

O Embate Político-Regulatório: PDL vs. ANEEL

O PDL 365/2022, de autoria do deputado Zé Neto, visa sustar as Resoluções Normativas n° 1.034/2022 e n° 1.035/2022 da ANEEL. Após ser aprovado na Câmara dos Deputados, o projeto seguiu para o Senado, onde já passou pela Comissão de Infraestrutura (CI) e agora está sob o crivo da CCJ. O relator no Senado, senador Cid Gomes, tem a responsabilidade de equilibrar a técnica regulatória com o clamor político-econômico do setor.

O debate central na CCJ não é apenas técnico, mas constitucional. A ANEEL defende sua competência técnica para regular as tarifas com base na Lei 9.427/96. Por outro lado, o Congresso, ao utilizar um PDL, exerce seu papel de controle sobre os atos normativos do Executivo (que inclui as agências reguladoras), argumentando que a regra do sinal locacional extrapolou a função regulatória, criando um desequilíbrio setorial e insegurança jurídica.

Insegurança Jurídica e o Mercado

A incerteza sobre a validade do sinal locacional tem provocado uma grave insegurança jurídica no mercado de energia. Investidores e financiadores de projetos de energia limpa dependem de regras claras e estáveis para calcular o retorno dos seus ativos. A possibilidade de uma mudança abrupta nas tarifas de transmissão, seja pela revogação via PDL ou pela manutenção da regra da ANEEL, paralisa decisões de investimento de longo prazo.

O setor clama por um arcabouço regulatório que seja previsível. A judicialização e a intervenção legislativa constante em questões tarifárias não são saudáveis. A instabilidade regulatória afeta a credibilidade do Brasil como destino de capital para projetos de infraestrutura de energia limpa, que são vitais para a transição energética e para o cumprimento das metas climáticas do país.

A Perspectiva da Geração Distribuída e Centralizada

Embora o debate sobre o sinal locacional afete primariamente a geração centralizada de grande porte (eólica e solar *utility-scale*), o clima de incerteza paira sobre todo o sistema, incluindo a Geração Distribuída (GD). A GD, regida pela Lei 14.300/2022, possui suas próprias regras de custo de conexão, mas a discussão sobre o uso da rede e a valoração da energia é sistêmica.

A aprovação do PDL 365/2022 daria um fôlego para as geradoras centralizadas, especialmente as do Nordeste, ao suspender o aumento dos custos de TUST/TUSD. No entanto, a ABRACE (Associação Brasileira de Grandes Consumidores de Energia) e outros grupos defendem a manutenção do sinal locacional como forma de promover uma alocação mais eficiente dos recursos. O custo evitado na rede de transmissão, argumentam, beneficia o consumidor final.

Cenários Futuros: O Que Esperar da CCJ

A CCJ é a última etapa de comissões do Senado antes da possível votação em Plenário. A decisão da comissão terá um peso significativo. Se a CCJ aprovar o parecer favorável ao PDL 365/2022, o projeto segue para a deliberação final, podendo sustar as regras da ANEEL e restaurar o regime tarifário anterior.

Caso o PDL 365/2022 seja aprovado definitivamente pelo Congresso, a ANEEL será obrigada a reavaliar suas normas, possivelmente buscando um caminho intermediário que concilie a eficiência locacional com o incentivo às fontes renováveis. É um momento decisivo que forçará o país a redefinir se a prioridade regulatória deve ser a otimização imediata da infraestrutura existente ou a promoção estratégica da energia limpa de longo prazo.

Em última análise, a votação na CCJ sobre o PDL 365/2022 é um teste para o equilíbrio institucional entre Legislativo e Agência Reguladora. Mais do que uma disputa técnica sobre tarifas de TUST/TUSD, é uma escolha sobre o modelo de desenvolvimento energético que o Brasil deseja trilhar, impactando diretamente a expansão da matriz de energia limpa e a distribuição de custos por todo o sistema elétrico nacional. O setor acompanha de perto, ciente de que o resultado definirá a bússola para os próximos ciclos de investimento.

Veja tudo de ” Análise Regulatória: CCJ do Senado Avalia Impacto do Sinal Locacional da ANEEL no Setor de Energia Limpa ” em: Portal Energia Limpa.

Deixe um comentário

Top